Com recolhimento concentrado em tributos indiretos e altas alíquotas sobre produtos in natura, o sistema de arrecadação pesa no bolso de famílias de baixa renda, que não entendem a forma de cobrança.
No momento em que a reforma tributária começa a aparecer no discurso dos três principais pré-candidatos à Presidência da República, pesquisa divulgada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) revela que o assunto está distante do dia a dia dos eleitores.
Embora eles tenham arcado com R$ 1,09 trilhão em tributos para manter o setor público no ano passado, a desinformação é geral.
Poucos contribuintes sabem, por exemplo, que o Brasil é um dos países que mais taxam a alimentação, com alíquota média de 16,9%, muito acima dos europeus (5,1%) e dos norte-americanos (0,7%).
A Fiesp entrevistou mil pessoas em 70 cidades, entre 20 e 30 de março, e descobriu que 84% até sabem que parte do dinheiro de suas compras vai parar nos cofres do governo.
No entanto, poucos conseguem adivinhar quanto do preço final dos produtos e serviços vem dos impostos.
Não mais do que 30% dos entrevistados disseram conhecer o percentual em itens como açúcar, luz elétrica, telefone, leite longa vida, frango, arroz, máquina de lavar roupa, sabão em pó, carne bovina e pão.
O detalhe é que, no caso desses itens, os consumidores apontaram valores mais baixos dos que os efetivamente pagos.
A carga tributária brasileira está em torno de 36% do Produto Interno Bruto (PIB), superior à de nações de igual nível de desenvolvimento.
Nas mercadorias nacionais, o peso dos tributos varia de zero a 80% do preço pago pelo consumidor.
As alíquotas aplicadas a cigarros (80%), bebidas (44%), gasolina (35%) e eletrodomésticos (33%) seguem o padrão internacional.
Os alimentos in natura (frutas, legumes e carnes) têm tributação média de 12%. O encargo é de 11% em itens alimentícios que passaram por algum processo industrial.
Para comer fora, a taxação é ainda maior, de 16%.
Todos concordamos que faltam informações claras sobre o pagamento de impostos na hora das compras, especialmente sobre alimentos, principais itens de consumo popular.
Gastamos quase 40% da renda mensal para abastecer a despensa e, eventualmente, almoçar fora com a família (considerando mulher e dois filhos pequenos).
A carga tributária ficou mais visível depois que um posto, em São Paulo, vendeu gasolina dando desconto de mais de 30%, correspondente ao valor dos tributos. Imaginem o quanto não devem cobrar em cima das frutas, da carne, do leite, que a gente compra toda semana.
Sabemos que a última coisa em que pensamos na hora de fazer compras é nos impostos. Nem temos ideia quais tributos incidem sobre os alimentos.
O maior peso vem do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), responsável por 43,6% da carga, seguido da contribuição para a Previdência Social e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), com 21,6%.
É péssimo lembrar que parte da nossa renda acaba com o governo. Lamentamos que o dinheiro que sobra é destinado a despesas que seriam supridas se o governo oferecesse serviços melhores.
Temos que contratar um convênio de saúde particular porque não temos hospital que nos atenda direito.
O grau de desinformação dos brasileiros é enorme. A classe política e as autoridades do governo jogam uma cortina de fumaça sobre o assunto e sonegam informações para a sociedade.
Eles roubam a sua carteira sem que você perceba. No fim, parece que tudo é grátis, que o governo recebe recursos de uma ordem divina e, então, oferece para a sociedade brasileira.
Os governos têm vergonha de mostrar para a população como arrecadam impostos.
Por isso existe uma recusa estatal em aprovar uma medida determinando que os consumidores recebam, na nota da compra, a informação do quanto pagaram de tributos em cada produto. Isso poderia ajudar a despertar a consciência e o espírito crítico dos eleitores.
Nós não percebemos os impostos e sempre reclamamos que é o supermercado que está caro.
Nunca tivemos a preocupação de conhecer sobre a parte das suas compras que vai para o governo.
Os tributos que incidem sobre o consumo e os serviços públicos, como energia elétrica e telefonia, são embutidos nos preços.
Por isso, pesam proporcionalmente mais sobre quem ganha menos. É o que se chama de efeito regressivo da tributação.
Atualmente, uma família com renda de até R$ 500 geralmente gasta mais de 32% do orçamento com comida, enquanto o percentual fica em torno de 10% para as famílias que ganham acima de R$ 10 mil.
As pessoas de baixa renda no Brasil são punidas porque o Estado prefere tributar os produtos, depois a renda e, por último, os ganhos de capital. Em outros países, a ordem é a inversa.
É inócuo o debate sobre a reforma tributária, pois não será possível mudar a estrutura de arrecadação sem que todo a gestão administrativa seja reformulada. Não será solução, enquanto tivermos um Estado perdulário e ineficiente.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que, quem ganhava até dois salários mínimos pagou cerca de 54% de tributos no ano.
Já os que ganharam mais de 30 mínimos recolheram muito menos, 29%.
Em outra perspectiva, enquanto os mais pobres trabalham 197 dias para pagar impostos, os mais ricos se esforçam muito menos: 106 dias, ou três meses a menos.
Nessa faixa anterior, gastasse, em média, cerca de metade da renda com alimentação.
Finalmente, sabemos que é impossível não haver cobrança sobre o consumo, mas reclamamos dos serviços públicos de saúde, segurança e educação.
O valor arrecadado tinha que ser mais justo, com retorno desse dinheiro para a maioria das pessoas.
Luiz S. Andrade